Porque dói ter esperança?
No conto de Clarice Lispector, “Uma Esperança” é inseto quase sem corpo, mas que tem uma alma, e, por isso, precisa de ser vigiado para que não desapareça, pela falta de atenção ou cuidados, e surja, no final da história, de alma e corpo como uma flor que nasce.
A Esperança requer atenção e cuidados próprios.
A Esperança, quer nesta história, quer na vida, requer atenção e cuidados próprios, tal como algo bastante delicado e que pode morrer facilmente. Requer ainda mais atenção e cuidados quando “se acredita” que nada vai mudar, independentemente do que se faça, ou porque já muito se fez, ou quando nada se espera.
Talvez seja verdade que nada mude, mas será que aquilo que não está a fazer porque não tem esperança não será o que está, precisamente, a matar as possibilidades de mudança?
Será que esta falta de esperança não se tornará numa profecia confirmatória que cria precisamente o que deseja evitar?
Acredita que nada muda se der a sua opinião, se respeitar as regras, se tiver um comportamento exemplar, se colocar amor onde há falta dele, se desistir em vez de persistir e um dia acorda e descobre que os cuidados que não teve causaram a “doença” em que se encontra e que tanta dor lhe provoca esta falta que tanto lhe retira a alegria de viver.
Afinal, porque dói a esperança?
Para responder a esta questão tão difícil é preciso entender o que é a esperança, como a recuperar quando tudo dá errado ou quando tudo parece acabar.
“A esperança é o sonho do homem acordado.“
Aristóteles
O que é a esperança?
A esperança é uma disposição que leva a esperar por uma coisa que se há de realizar. Esta experiência humana é prima do otimismo e da confiança. Enquanto virtude cristã tem como aliadas a fé, que leva a acreditar sem se ver, e a caridade, que tem como orientação agir em justiça para com o outro. Qualquer uma destas visões da esperança são antídotos para a falta de ânimo, o desespero, o desamparo, a falta de sentido, o abatimento, o desânimo, o medo e possibilitam o surgimento da experiência ou expectativa de amor, beleza e alegria autêntica.
Se tem esperança, quer como disposição de espírito, quer como virtude (que é algo que se adquire com esforço, que não é espontâneo), precisa de confiar. Mas…
O que significa confiar?
Con-fiar é conceder um crédito, é dar algo sem se receber de imediato na expectativa que se obtenha algo no futuro. Confiar significa atuar no presente esperando a realização de algo futuro.
Tudo isto pode fazer muito sentido para alguns e para outros nem tanto. Para si, que não lhe faz sentido, talvez seja porque agiu esperando o que nunca se concretizou – investiu num casamento que se desmoronou; trabalhou para uma promoção ou um lugar que não conseguiu; investiu as suas economias em algo que não deu certo; ou outra coisa qualquer que resultou numa estagnação ou bloqueio. E, por isso, talvez não acredite ou tenha receio de ao fazer algo, iludir-se e cair novamente na mesma situação. Contudo, esse medo de tentar e não conseguir é superior à voz da vontade de quer acreditar ou escutar aquele ditado, que ecoa e relembra a sabedoria popular nestas palavras: enquanto há vida, há esperança…
Convido-o(a), por um momento a refletir e responder a esta questão: o que faria de diferente na sua vida se atuasse, no aqui e agora, como se fosse uma pessoa cheia de esperança? O que seria diferente? O que se mantinha?
Como ter esperança quando tudo dá errado?
“As noites sem estrelas podem anunciar a aurora de uma grande realização..“
Martin Luther King
No filme “Os condenados de Shawshank”, Andy (Tim Robbins), um banqueiro de sucesso, é condenado com duas prisões perpétuas, pela morte da sua mulher e amante desta, apesar de estar inocente.
Numa passagem do filme, Andy, apesar de ter desenvolvido várias iniciativas na prisão que o tornaram necessário para o diretor, guardas e presos, foi parar vários dias à solitária por ter colocado música para todos os presos enquanto se trancava no gabinete do diretor da prisão. Quando Andy regressou, relata que nunca esteve só porque teve consigo a companhia da música de Mozart e dos seus sonhos, que o acompanharam e lhe deram esperança. Red (Morgan Freeman), um contrabandista com quem tinha desenvolvido uma amizade singular, reage vigorosamente exclamando: “a esperança é algo de muito perigoso”! Para um condenado sem esperança, nada era mais arriscado do que ter sonhos que não se podiam tornar realidade, o que aconteceu, fruto do espírito astuto e diligente de Andy que fugiu da prisão e possibilitou que, mais tarde, também Red pudesse usufruir do recomeço de uma nova vida, de sonho.
Qual a solução para acreditar, vencer o medo e ousar esperar?
Mesmo que doa, mesmo que tudo parece terminar, nas palavras de André Lima, “a alma chama, os pés chamam, a vida chama, andar, sair, caminhar sempre” e sonhar a vida de sonho, até que deixe de ser um sonho e passe a ter a vida de sonho.
“O fim da esperança é o começo da morte…“
Charles de Gaulle
Como ter esperança quando tudo parece acabar?
No livro “A terra e os Homens”, de Antoine Saint-Exupéry, um piloto de um avião cai nas montanhas dos Andes e depois de vários dias perdido, no meio da neve, sem qualquer orientação e contra todas as probabilidades, sobrevive. Qual foi o seu segredo? O que o salvou, nas suas palavras, foi ter tido a coragem de dar sempre um passo adiante; o ter dado um passo a mais e não ter desistido de caminhar, o ter dado um passo a mais, esse mesmo passo que se dá quando se recomeça.
Então, o que pode fazer para ser uma pessoa com maior esperança quando tudo parece dar errado ou quando tudo parece acabar?
7 Dicas para manter a esperança:
- Dê atenção ao que se acredita (ou não) e repita as afirmações que reforçam tornar-se uma pessoa com esperança;
- Caminhe, atue, faça algo como se tivesse uma reserva inesgotável de esperança;
- Encontre uma razão para não desistir. Pense naqueles que gosta e que podem sofrer com a sua falta de esperança;
- Insista, persistia, nem que seja apenas como um passo mais, perante a “evidência” que tudo pode estar a acabar. E continue, um passo mais, um gesto mais, uma ação mais;
- Ouse confiar e, se tremer perante essa possibilidade, pense: “O que pode ser o pior que me vai acontecer se confiar? O que pode mudar se confiar?”. E arrisque…;
- Determine-se a não renunciar ao poder que tem de influenciar e conduzir a sua vida e a dos outros. Porque a melhor forma de abdicar do seu poder é pensar que não o tem;
- Se acredita que é filho(a) de Deus permita esperar o cumprimento das Suas promessas. E, enquanto tarda o tempo e o silêncio, viva como já tivesse o que ainda não tem.
“A neve e as tempestades matam as flores
Mas nada podem contra as sementes.”
Kahlil Gibran
Não há vida sem esperança!
A neve, as tempestades podem matar as flores da sua vida. Mas, não há vida sem esperança. E a esperança é a semente que só pode desaparecer (e, para alguns, nem assim) com a morte. Por isso, deixe as palavras populares ecoarem e pousarem na sua alma: “Enquanto à vida à esperança”. Permita, assim, que estas possam conduzir o seu destino, pois de outra forma, mesmo que não saiba, está morto(a) e só aí é que esperança já não lhe dói.